Depois de mais de uma década de violações aos Direitos Humanos com a implantação do Programa Lagoas do Norte – PLN, Conselho de Administração do Banco Mundial (órgão patrocinador do PLN), sinaliza pela necessidade de investigar as remoções das famílias. A notícia chegou às vésperas do ano novo e pode significar um passo à frente para garantia do Direito à Moradia em Teresina, graças a luta das famílias ameaçadas de remoção.
Entre os dias 7 e 10 de novembro deste ano, uma comissão do Banco Mundial (BM) esteve em Teresina para apurar as denúncias de violações do programa. Em 13 de dezembro o Conselho de Administração do Banco Mundial aprovou o Relatório e Recomendação do Painel de Inspeção sobre o Projeto de “Melhoria da Qualidade de Vida e Governança Municipal de Teresina – Programa Lagoas do Norte”, no qual o Painel recomendou uma investigação sobre o projeto em execução na capital.
O milagre não cai do céu. Este é resultado de lutas incansáveis e diárias. Após esgotadas as tentativas de diálogo com a Prefeitura Municipal de Teresina, as famílias atingidas resolveram acionar órgãos internacionais para denunciar o que vem ocorrendo na zona norte da cidade. Apenas para implantação da primeira fase do programa, centenas de famílias foram desapropriadas de suas moradias e seus modos de vida foram desestruturados.
Ainda em 23 de agosto de 2019, 202 famílias assinaram carta enviada ao Painel de Inspeção do Banco Mundial. A seguir um trecho da carta:
“Acreditamos que reassentamento involuntário seja a última opção para o projeto, de acordo com a política do banco, mas na verdade não é dessa forma que está acontecendo, os moradores não estão tendo a opção de ficar nas suas residências, pois a prefeitura obriga os moradores a sair do local sem necessidade, por que tem área suficiente para construção parque sem a remoção das famílias. O que queremos, é permanecer em nossas residências e disfrutar da beleza do parque futuramente.”
As denúncias vem sendo registradas pelas moradoras atingidas pelo Programa Lagoas do Norte e comprovadas em vídeos. Assista:
Banco mundial considera as denúncias de natureza grave. Ministério Público continua acompanhando o caso
De acordo com informações do Banco Mundial, “O Projeto de Melhoria da Qualidade de Vida e da Governança Municipal de Teresina foi aprovado em março de 2008, com um empréstimo do BIRD no valor de US$ 31,13 milhões e um financiamento de US$ 13,34 milhões do Município de Teresina. O Financiamento Adicional foi aprovado em fevereiro de 2016 com recursos financeiros do BIRD no valor de US$ 88 milhões e US$ 88 milhões em recursos do Município de Teresina. O Financiamento Adicional visa cobrir uma lacuna no financiamento e possibilitar a conclusão das atividades previstas. A data de encerramento do Projeto é 15 de dezembro de 2021”.
No parecer do BM, recomenda-se que:
“86. O Painel conclui que os Solicitantes e o Pedido de Inspeção atendem critérios de elegibilidade estabelecidos na Resolução que estabelece o Painel de Fiscalização e o Esclarecimento 1999. O Painel observa ainda que o alegado dano é de natureza grave e possível nexo de causalidade entre o alegado dano e o possível incumprimento por parte do Banco com a sua políticas e procedimentos operacionais.
87. O Painel congratula os compromissos da Administração como um passo positivo. No entanto, considerando as observações acima indicadas, nesta fase, o Painel não está convencido de que estes compromissos são adequados para abordar as preocupações suscitadas pelos solicitantes, de acordo com as políticas e procedimentos do Banco.
88. À luz do que foi acima exposto, o Painel está recomendando uma investigação sobre as questões levantadas no Pedido. Se o Conselho de Administração Executiva concordar com esta recomendação, o Painel informará os Solicitantes e a Administração em conformidade”.
O Ministério Público do Estado do Piauí e a Defensoria Pública Federal acompanham o caso durante todo o tempo de execução do Programa. “O Banco Mundial deve determinar que a PMT reveja as remoções. No caso da Rua Manoel Aguiar, no Mafrense, a PMT já suspendeu as conversas com os moradores. O MP continuará acompanhando o programa Lagoas do Norte.” Declarou o Promotor Fenando Santos, do Ministério Público do Estado do Piauí.
Ainda de acordo com o documento, o painel observou que há diferentes posições entre as famílias quanto a permanência ou não, sendo que algumas famílias optam pelo reassentamento. No entanto, há dúvidas se o programa buscou evitar o reassentamento de acordo com a política do Banco. Considera-se, pois, que os afetados alegam não terem sido consultados de forma apropriada, bem como alegam falta de participação no planejamento do reassentamento.
Outra problemática apontada pelo painel, é a existência de grupos socioeconômicos heterogêneos entre a população afetada pelo programa. Neste caso, há uma fragilidade quanto ao estudo socioeconômico usado na preparação do Plano de Reassentamento Involuntário (PAR). Por conta da incompletude no que tange a este estudo, o Painel questiona se opções de compensação são coerentes com as diferentes condições socioeconômicas das famílias a serem reassentadas.
O Painel expressou ainda que não está claro se as opções de compensação levam em consideração a heterogeneidade das famílias a serem reassentadas. Além disso, questiona-se se as atividades de emprego e geração de renda são adequadas para restaurar os meios de subsistência da população afetada.
Link do processo e parecer emitido pelo Banco Mundial:
Originalmente publicado em: https://ocorrediario.com/programa-lagoas-do-norte-banco-mundial-abre-investigacao-para-apurar-violacoes-do-direito-a-moradia/?relatedposts_hit=1&relatedposts_origin=6061&relatedposts_position=0&relatedposts_hit=1&relatedposts_origin=6061&relatedposts_position=0